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Rio+20: saldos e rescaldos

Por Mauri J.V. Cruz, GRAP

É bastante difícil fazer um balanço da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a chamada Rio+20. São várias as possibilidades de avaliações, deste a existência em si da Conferência, passando pela mobilização mundial e pelo número de eventos e atividades que anteciparam e se seguiram durante mais de 10 dias no Rio de Janeiro.

Para uma avaliação produtiva é preciso compreender o que estava em jogo. Para os governos, por exemplo, a Rio+20 era mais um palco para a disputa de estratégica de enfrentamento da crise econômica capitalista iniciada em 2008. Neste campo, EUA e Alemanha trabalharam para que a Conferência não aprovasse nenhuma orientação de cunho desenvolvimentista. A aposta era de uma linha dura, recessiva e de cortes públicos. Já os países em desenvolvimento liderados pelo Brasil tinham a clara intenção de aprovar uma estratégia de retomada do crescimento econômico através de investimentos públicos articulados com os setores privados da economia.

Na outra ponta, a disputa estava entre os setores privados e as organizações e movimentos sociais. As grandes corporações empresariais viram na Rio+20 a oportunidade de legitimar o conceito de economia verde e a chancela internacional implícita neste conceito de que somente o mercado pode superar a crise econômica e proteger o meio ambiente. Já as organizações e os movimentos sociais, a partir de uma avaliação de fragilidade na correlação de forças internacional, apostavam na crítica ao modelo desenvolvimentista e na denuncia ao conceito de economia verde por compreender que muda o rótulo mas o conteúdo é o mesmo do modelo que concentra riqueza, degrada o meio ambiente e fragiliza a economia mundial.

Passada a Conferência, na minha modesta opinião, ficou quase tudo no zero a zero. Nem ganhou o bloco liderado pelos Estados Unidos nem o bloco liderado pelo Brasil. Tudo ficou para daqui a dois anos e até lá muita discussão e disputa. Na embate entre as grandes corporações privadas internacionais e as organizações e movimentos sociais idem. Nem a economia verde foi ovacionada como solução milagrosa nem um novo conceito de sociedade justa e sustentável ganhou destaque. Talvez o grande saldo seja mesmo o tema da sustentabilidade ter entrado na agenda mundial de forma definitiva.

Neste sentido, nossos dilemas continuam urgentes. Primeiro porque uma das causas da falta de sustentabilidade são as profundas desigualdades mundiais. Em pleno século do conhecimento há mais de um bilhão de pessoas abaixo da linha da pobreza no mundo. E, a ideia de que o mercado é capaz de superar esta diferença é uma terrível ilusão. Nosso dilema, como raça humana, é que neste modelo econômico capitalista não é possível incluir todos. É um modelo que só funciona se for para uma parte pequena da humanidade. Vejamos o exemplo dos automóveis. Se todo cidadão tiver direito a um automóvel, ninguém consegue circular nas ruas das cidades. Portanto, manter este modelo é optar pela exclusão.

Minha convicção é de que nosso desafio é mudar a agenda do desenvolvimento. É preciso identificar os temas e as soluções que realmente tenham a capacidade de atender as necessidades de todas as pessoas sem degradar o meio ambiente. E isso não passa pela maioria dos temas da atual agenda do desenvolvimento.

É preciso rever as tecnologias e, principalmente, as escalas e dimensões dos projetos das novas soluções tecnológicas. Mais que isso, é preciso definir quem paga a conta destes câmbios dos processos produtivos. Não há saídas sem o fortalecimento das soluções de caráter local e com o empoderamento e fortalecimentos da gestão das comunidades sobre seu próprio futuro.

Desta forma, é preciso rever o papel do estado. Não como um mediador entre os conflitos de interesses das grandes corporações capitalistas. Os Estados Nacionais precisam ser os grandes indutores das mudanças. Por isso, a Conferência das Nações Unidas deixou tanto a desejar. Os governos, na sua maior parte, se limitaram a representar os interesses das suas corporações privadas. Felizmente, o Brasil tentou se diferenciar.

Por isso, nosso país tem todas as condições políticas, sociais, econômicas e ambientais para liderar um processo mundial de mudança da agenda do desenvolvimento, da discussão de quem paga a conta e do reposicionamento do papel dos estados na gestão do modelo econômico mundial. Mas para isso será preciso uma opção mais clara pela sustentabilidade e um maior fortalecimento da articulação entre governos, organizações e movimentos sociais e, porque não, com os setores corporativos empresariais realmente comprometidos com as mudanças. E temos que ter a plena consciência de que nesta era de mudanças climáticas o tempo corre contra processos políticos de longa duração. É preciso decidir de que lado estamos.